26.6.05

Sociedade Anónima S.A.


Ele era diferente de todos os outros energúmenos que encontrara em todos os empregos que teve. Fora ajudante de canalizador, trolha, cozinheiro, só ajudante.
Todos os dias comia a mesma sopa de legumes que a mamã lhe fazia até ao dia em que ela lhe faltou, vivia agora na cova nº 55 do cemitério da Boa Viagem. Vive agora sozinho com o Milu, um cão rafeiro que anda com as duas patas da frente arrastando as outras. Sempre havia sido habituado às melhores refeições da gastronomia canina e agora come os restos do novo dono, amendoins, cascas de tremoço e côdeas de pão. Apenas à semana pois nos outros dois dias chega a maninha Josefa vinda dos lados de Loures para o 3º andar do prédio azul da Rua Salgueiro Maia, Caxias.
Solteira e infeliz, Josefa procura um marido há 26 anos, desde que saiu do colégio de freiras, sem sucesso. A verruga no meio do seu nariz oblíquo e empinado não ajuda. Arruma o T1 agora do irmão ao sábado de manhã, faz o almoço, o jantar e no tempo vago vê televisão, só. As únicas palavras que os dois trocam são “Não mudes”, um quando vê o compacto da novela e o outro quando dá o Benfica.
Num desses loucos dias por entre a porta de madeira neo-zelandesa pré-revolução passa uma carta de tom alaranjado. Josefa ainda se apressa a abrir a porta mas ninguém aparece. No seu jeito maternal abre a carta com todos os cuidados enquanto o irmão faz a barba ao som de uma música do Júlio Iglésias, sem ele se aperceber.
Em letras minúsculas leu – a encomenda chegou. Dirige-te lá na segunda às 4 – soltando um grito. Seria droga?
O irmão não ouvira.

3 Comments:

At 10:37 da manhã, Blogger impulsitem said...

os restos do novo dono.

 
At 12:37 da tarde, Blogger KOE said...

hmm.. continua? era bon.

 
At 11:47 da tarde, Blogger D said...

viva ao sócio!

 

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